Este é um conto para o cenário Era dos Herdeiros, de minha autoria. Ele desenvolve a história por trás dos vampiros que existem no cenário.
Eu escrevia em minha mesa de carvalho quando aquela moça veio até mim. Eu realmente gosto muito dessa mesa, a qual eu escrevo esse relato agora mesmo. Mas a mesa não importa, a mesa merece uma história só para ela. A menina veio até mim. Ela era jovem. Ainda é, de certa maneira, e será até o dia de sua morte. Sua pele era caucasiana, com a pele de seus pais, e tinha cabelos ruivos. Se apresentou para mim como Samantha Miller, princesa de Osten, filha do Rei de Osten.
“Eu quero saber como meu pai foi morto, demônio” ela tinha me pedido.
E eu a pedi para se sentar, pois seria uma longa história.
Tudo começou quando o Rei de Osten ainda não era um rei, e apenas um nobre, chamado de Paul Miller, da família do barão de uma cidade próxima da fronteira entre Osten e Nadallos. Durante a Era do Tijolo, muitos conflitos se estabeleceram naquela região, afinal, os humanos se negavam a se unir como os elfos fizeram. Durante um avanço das tropas de Osten contra as tropas de Nadallos, Paul viu a oportunidade de saquear uma casa aparentemente vazia.
Puxando as poucas riquezas daquela residência para sua bolsa, Paul encontrou uma mulher ali. Parecia tão frágil e indefesa. Mulheres nortenhas eram diferentes para homens sulistas. Sua pele escura era exótica para o olhar podre de Paul, e o soldado a tomou naquele momento. A mulher lutou, mas não havia o que fazer, enquanto Paul usava sua força contra a vítima de seu abuso. Depois de se satisfazer com o corpo da nortenha, Paul a matou, para garantir que ela fosse o incomodar mais. Ele saiu da casa se sentindo vitorioso.
O que Paul tinha deixado de perceber é que uma garotinha o observava pelas fendas da porta de um guarda-roupas que ele não saqueou. A filha da mulher estuprada observou cada segundo do abuso de sua mãe, assim como seu assassinato a sangue frio. Sulistas eram frios por natureza, por terem nascido no meio da neve, mas aquilo já era demais.
Essa menina também tem um nome. Não tão imponente quando o tome de Paul Miller, mas tem. Anna Carolaine. Ela veio até mim, assim como essa garota que ouviu a história também veio. Mas ela não pediu para saber como sua mãe tinha morrido, pois isso ela já sabia. Ela veio com um pedido mais audacioso. Ela queria um pacto. Ela queria poder. Ela queria vingança.
De imediato, eu disse que não era comigo com quem ela devia tratar. Vindi, a Démona da Vingança faria de bom grado um estrago contra Paul Miller. Mas Anna me disse que Paul se tornará rei após o final da guerra, e as ações dos demônios não poderiam o afetar por conta de tanto poder que ele tinha agora. Reis tem fontes de energia primordial vinculadas aos seus espíritos por poderosos clérigos, por mais injusto que isso fosse. Essa energia os protegia das maquinações dos demônios.
Mas é claro, alguém como eu sabia como passar por cima disso. Eu nunca tinha tentado antes, o que me deixou ainda mais empolgado. Seria um encantamento difícil, e dolorido, além de acompanhar uma maldição terrível.
Entretanto, ela não parecia se importar com isso.
Por sete dias e sete noites eu trabalhei o encantamento sem descansar, invocando magias, proclamando feitiços e erguendo bruxarias. Anna seria a primeira a passar invisível pelos olhos de A Primordial, a energia que tudo tinha criado, a maior das celestiais, fonte de todo o poder e energia. Anna se tornaria uma emissária das sombras, uma assassina pronta para matar qualquer alvo.
Anna se tornou a primeira vampira.
Ser invisível aos olhos d’A Primordial dava a ela o poder se ser invisível a qualquer momento para os mortais também. Seu corpo não podia ser detectado como nenhum tipo de criatura, pois ela já estava morta. Também não era detectada por magias de detecção de mortos vivos, pois ela não era exatamente um morto vivo. Não havia nada vivo nela, fora a própria consciência. Seu coração não batia, seus pulmões não respiravam, seu sangue não fluía. O sangue, inclusive, é uma parte importante. Para os poderes continuarem, ela precisaria beber sangue de outras criaturas. No sangue, existe a magia de todo ser vivo, e essa magia era o que movia ela. Além dessas habilidades, ela ficou muito mais rápida e forte, sua voz ficou muito mais bela, sua mente pensava muito mais rápido, e não importava os castigos físicos a sua pele, pois toda noite, seu corpo voltava exatamente da mesma maneira que estava antes do ritual. Ela não estava apenas morta. Ela estava estacionada, não podendo nem ser tocada pelo tempo.
Apenas uma coisa poderia destruí-la. Um ataque d’A Primordial diretamente. Ela era uma negação a natureza, portanto a energia pura d’A Primordial a destruiria. Anna não podia sair no sol. Além disso, os olhos de todos podiam ser fechados para ela, mas tudo que ela visse, eu também saberia. Uma espiã perfeita. Tudo que ela soubesse, eu saberia.
E havia mais uma parte. Uma parte que eu, admito, não previ. A fonte do meu poder também é A Primordial, assim como a fonte de toda a energia de Lauminen. Isso fez com que Anna fosse amaldiçoada para balancear o ciclo das coisas. Sempre que ela matasse alguém em decorrência dos poderes que eu a dei, alguém, em algum lugar do mundo, morreria, e se tornaria uma versão piorada de Anna. Um vampiro menor. Esses vampiros menores não eram nem perto de tão fortes, ágeis ou espertos quanto Anna, mas eram mais do que quando tinham vida. Porém a vontade de consumir sangue que, para Anna servia apenas para se lembrar dos poderes, para os vampiros menores era uma dor forte, que os obrigava a caçar. Eu contei dos efeitos colaterais, mas Anna não se importou. Não pensou que iria matar muita gente de qualquer maneira. Só queria matar o Rei Paul Miller.
E ela conseguiu.
Obviamente.
Ela foi invisível até onde o rei dormia. Colocou um veneno em sua água. Um veneno que iria demorar muito tempo para fazer efeito. O rei bebeu sua água ao acordar e passou o dia fora. Provavelmente viveu sua vida de luxúria durante a maior parte do tempo. Mas ao anoitecer estava em casa. Estava bem mais cansado do que quando saiu, por conta do veneno. Anna, que tinha esperado o dia todo ali, finalmente se revelou.
Reis são normalmente guerreiros poderosos, afinal, apesar dos feitos de divindades não surtirem efeitos neles, os homens ainda podiam tentar matá-los. Mas ele mal conseguia sacar sua espada. O veneno já estava debilitando todo o corpo do rei por dentro. Um golpe com uma adaga e Paul Miller estava morto. Anna tinha cumprido sua missão.
Quando eu terminei de contar essa história, Samantha olhava para mim com atenção.
“Eu quero me tornar uma vampira também”
Eu ri.
Obviamente.
“Criança, eu não posso dar esse poder para qualquer um, ou todas as pessoas de Lauminen se tornariam vampiros. Eu tenho que manter um número seleto de vampiros maiores, e controlar bem a proliferação dos vampiros menores. Só irei tornar alguém vampiro de novo se ela se mostrar digna. E penso inclusive em apenas oferecer essa oportunidade para vampiros menores.”
E então ela fez meu dia.
“Eu sou uma vampira menor” ela disse. “Eu sou quem se tornou vampira quando meu pai morreu. Eu quero matar Anna Carolaine. Me torne uma vampira maior, e eu irei matá-la, beber seu sangue para me tornar mais forte, e matarei ainda mais pessoas para aumentar sua horda de vampiros menores. Vou compartilhar o meu poder pelo sangue aos vampiros menores os quais eu achar dignos, e verei eles espalhando o seu poder. Você terá olhos em todos os lugares, Dante. Dê-me minha vingança.”
Eu sorri para ela.
Vingança cíclica. Uma menina vinga mãe matando um pai. Uma menina se vinga seu pai matando quem o matou por vingança. Alguém mataria Samantha pelo o que ela fez. Mas esse não era meu trabalho. Além disso, ela realmente tem boas ideias de como manter em controle a minha maldição de vampiros.
Espero que ela use bem os poderes que eu dei a ela.
Agora, eu devo parar de escrever. Anna acaba de me avisar que outro vampiro menor chegou para tentar barganhar. Ela é uma das minhas escravas agora. O preço de se fazer um pacto com o Demônio dos Sussurros.